A casa estava quente e melancólica demais. Senti um aperto no peito, uma angústia, um desespero claustrofóbico por espaço e oxigênio. Aspirei, por um instante demasiado longo, à solidão. Discretamente, como se sentisse vergonha da minha própria covardia, escapei para a varanda de azulejos azuis. Estirei-me sobre o sofá, respirei lenta e profundamente de olhos fechados, aspirei a solidão. Bem melhor.
Um canto de passarinho penetrou meus ouvidos. D'onde vem? Abri meus olhos preguiçosos e olhei em volta. Tudo era só cimento, azulejo e metal - humano demais, frio demais, triste demais -, no entanto havia, ainda assim, um canto de passarinho, como uma trilha sonora de minha angústia. O nó na garganta se afrouxou, a pressão no coração diminuiu. Compaixão: uma, duas, três gaiolas penduradas ao pé do tanque. Um, dois, três canários pulando feito macacos (humanos!) de poleiro em poleiro. Compreensão. Compaixão.
Pobres...amputaram-lhe as asas sem aleijá-los, impediram-nos de voar. Angústia. "Eles alegram o homem", foi a justificativa. Aproximei-me da gaiola, fiquei com o nariz colado na grade, os olhos marejados. Cada canário levava uma pulseira de chumbo no pé (Piu, piu!). Observei a gaiola: uma porção de alpiste, um tiquinho de água e as finas barras de metal (humano!) que delimitavam a senzala. Um, dois, três escravos da melancolia humana. Oh, pobres!
Encarei-os por tempo o suficiente para reavivar a angústia, agora com força redobrada. Não tinha mais jeito, não dava mais para ficar nem na varanda, nem ouvindo as sentenças sem sentido que faziam no interior da casa. Sem poder dizer uma palavra sequer ("Eles alegram o homem"), com a compaixão pelo homem e pelos pássaros lutando dentro de mim, minha atitude foi covarde. Virei as costas para a sala de estar e virei as costas para a senzala; deitei, fechei os olhos e forcei um sonho bom.
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