sexta-feira, 22 de junho de 2007

O que o meu lado gaúcho tem a dizer sobre o dia 24 de Junho

Saudade não é bem uma palavra triste. Na realidade, é alegre como o céu de uma segunda-feira de manhã: a gente sempre deseja poder voltar pra sábado, mas não consegue deixar de sorrir com o desenho das nuvens ao sol. É...é bem assim mesmo. As horas vão passando, vão passando...logo já é sexta-feira e a gente nem se deu conta. Mas céu nenhum repete o outro, não há nuvens idênticas (e de vez em quando chove).
Eis aí a mágica da fotografia. Muitas vezes me lembro de algo que aconteceu há tanto, tanto tempo, que não sei se é verdade ou se eu imaginei. Aí vem a fotografia, aquele segundo que durará décadas, e me mostra que a vida realmente é incrível.
(...)
Engraçado que os fatos especiais, quando distantes, parecem sonho. Quase tudo que se passou fora do Rio já virou sonho, principalmente Novo Hamburgo. Antes doía tanto lembrar...agora é tão maravilhoso!
Lembro da primeira vez que fui ao Ateliê dos Blauth. Fiquei encantada com a doçura daquela que, um dia, comecei a considerar minha avó, e com o talento, tanto dela quanto do "vô" e da Tia Sofia. Eles me ensinaram a ver o mundo de outra forma e eu nem sei se disse isso a eles antes de ir embora.
(...)
Nas tardes de inverno, Babi e eu sentávamos na clareira do sítio e comíamos pinhão quentinho. Quando a vó chamava para o chá, nos espichávamos todas na rede e bebíamos chimarrão. Eu não gostava muito na época, achava amargo. Agora penso que, se saudade tivesse gosto, seria de erva-mate.
(...)
Várias vezes viramos a noite com histórias de terror. Uma vez, inclusive, na noite da fogueira, berramos pelo Tio Paulinho porque tínhamos medo de voltar pra casa com os sapos que coaxavam no riacho. Nessa mesma noite, deitadas na grama-palha entre os pinheiros, olhamos o céu e vimos incontáveis estrelas. Foi o dia em que me apaixonei pela astronomia.
Naquele riacho, onde os sapos reinavam à noite, Babi e eu catamos peixes com miolo de pão e um escorredor de macarrão. O carpinteiro do Ateliê prometeu que ia trazer varas sem anzol, mas eu fui embora e nada de nada. Lembro que multiplicamos 7 vezes o número real de peixes que catamos, e a vó fingiu acreditar.
Outra coisa de incrível eram os cachorros: haviam tantos que nem sei se lembro. Meu preferido era um collie mestiço que quando pulava ficava do meu tamanho, bobalhão que só ele. O vô Ricardo dava de comer a eles toda manhã, com um daqueles sacolões enormes de ração.
(...)
Mas, dentre toda essa pacata vida de interior, não há nada que me dê mais saudade do que o caminho do colégio até a minha casa. Havia um ônibus só da Fundação (onde estudávamos), que tínhamos de pegar todo dia às 6:56, a um quarteirão e pouco de distância de casa (sim, morávamos em casas!). Sempre as mesmas pessoas esperavam conosco no ponto, mas nunca falamos com eles.
{Pauso minha reflexão: fato que os gaúchos são meio secos, mas mesmo assim eu os adoro.}
Continuo minha reflexão: O caminho de ida era chato porque o motorista ligava na rádio de pagode que todo mundo detestava, e acabávamos todos emburrados antes das 7:30. Mas na volta, quando Lucas e eu nos sentávamos, eu já procurava estar bem próxima da janela direita pra quando passasse na casa da Gil (a minha madrinha de consideração) eu poder acenar pra ela. Era infalível: todo dia ao meio-dia Gil parava na janela com sua cachorrinha poodle, a Nina, a tiracolo. Era só o ônibus passar que eu abria a janela e gritava: GIIIIIIIIIIIIIIIL! com toda a minha força; e de longe ela respondia com um sorriso e um aceno, que nunca mais se apagaram da minha memória.
Agora já respingo a página todinha de lágrimas, sou uma boba mesmo. De certa forma eu construí uma família por lá, uma família que não vejo há tantos anos que já nem sei se foi de verdade ou foi fantasia. Meus "avós" e sua arte, meu "tios" e seus conselhos, minha "irmã" e suas bizarrices, minha "madrinha" e os nossos filmes, minha locadora e os meus pôsteres...existiram?
Quando me encho de coragem, abro minha gaveta de lembranças e vejo todas as cartas, fotos e desenhos que eles fizeram quando houve a minha despedida. Foi o melhor e o pior aniversário que já tive. Aí, apesar do meu azar junino crônico, penso que todo dia 24/06 à noite as vozes do passado voltarão, meio abafadas por um choro de saudade, só pra dizer "Feliz Aniversário"; e de repente sou a pessoa mais sortuda desse mundo.

(Sintam-se honrados, acabam de ler um trecho do meu "diário")

3 comentários:

Anônimo disse...

lindo.

Anônimo disse...

pofrundo

Anônimo disse...

*paf*